De quem é essa cidade aí?

De quem é essa cidade aí?

10 de abril de 2018 0 Por Roger Neves

CPR_180325-15Sábado, 25/03, tivemos o prazer e a honra de receber em nossa região, no “CONPOEMA Recebe…” o grupo de teatro Nativos Terra Rasgada, com o espetáculo “Rua sem Saída”, através de sua circulação pelo interior do estado, financiada pelo Edital de Circulação de Artes Cênicas para Rua do Programa de Ação Cultural – ProAC – do Governo do Estado de São Paulo, que nesta apresentação também contou com o apoio da Secretaria de Cultura de Franco da Rocha. Quem passou pelo Parque no centro de Franco, pode se juntar à bonita roda de cerca de 150 pessoas, num belíssimo e quente fim de tarde e aproveitar toda perspicácia e inteligencia de um espetáculo politicamente ácido, mas ao mesmo tempo bem sutil e bonito.
O espetáculo é uma divertida crítica sobre o direito a cidade, as forças que a governam e como a população em geral é oprimida por aqueles que nomeiam as “lápides” espalhadas pelos cantos da cidade. Através da estória de três moradores de rua que, expulsos violentamente de seus lugares, acabam encontrando em um cemitério abandonado seu único refúgio e decidem ocupar o local; o grupo sorocabano, com 15 anos de caminhada, faz uma precisa e bem humorada crítica que resume bem a história de muitas cidades no Brasil e o modo como elas funcionam. Inclusive essas aqui de nossa região. (Fato curioso#1: eles nos contaram que a “ocupação” do cemitério foi inspirado num caso verídico que aconteceu na América Latina). A partir daí a estória (misturada com história) se desenvolve com as entidades que comandam o além-mundo público (e que ficaram incomodadas com a chegada dos novos vizinhos, gente diferenciada) se articulando para expulsar essa gente muito viva.

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O Nativos Terra Rasgada (Fato curioso#2: o nome do grupo é inspirado no nome e na história da cidade de Sorocaba) além da mira certeira do tema principal, também aborda outros importantes temas, de maneira secundária, como as sutilezas das relações de poder em nossa sociedade, o modo como o sistema coopta, ao promover ao mesmo grau das “entidades” lideres de movimento, diferentes tipos e modos de exploração, o papel central da educação na transformação da sociedade, dentre outras importantes questões. Sempre de uma maneira bem humorada e inteligente. Um deleite que manteve vidradas diferentes faixas etárias nos cerca de 50 minutos de apresentação.
Já no começo da noite, o grupo ainda teve fôlego para bater um papo sobre o espetáculo, o direito a cidade, o momento que passamos no país e sobre o processo de criação e trabalho do Nativos. (Fato curioso#3: eles também nos contaram que o processo todo de montagem, entre criações de cenas, ensaios, crises existenciais de grupo e demais fatos da vida, levou cerca de quatro anos até a versão final). A crítica proposta pelo espetáculo é muito pertinente e encontra atualmente (pós manifestações de 2013) um terreno bastante fértil e o momento certo para se colocar, onde o tema está bastante em voga ainda e até algumas instâncias governamentais já aderem ao debate sobre o direito à cidade e a reorganização da governança em diferentes níveis.
Certamente um belíssimo trabalho!
Agora um último fato curioso: por quê a cidade, simbolicamente, é representada por um lugar cheio de gente morta, enterrada junto com instituições falidas? Essa deixamos pra você pensar. 🙂

Texto: Roger Neves

Fotos: Fabia Pierangeli