Ficção da Vida
17 de julho de 2015Em mil palavras escrevo esta história de instante
— um sopro, uma voz, uma árvore, um leque…
em que residimos. A mínima definição
antes mesmo do movimento. Qual a palavra
mais precisa que distingue os olhos dos braços,
a cena do cenário, o tempo da ação? Procuro-a.
Passam, definitivos, vida e morte acompanhados
pela sucessão. Bate, memória, teu martelo…
De cada grão em seu espaço faz-se areais.
Um cabelo caído na grama, qual a sua importância
em todo o suborno das cores que operam o verde e o negro?
Onde leva a soma de tudo, absoluta? Ao infinito?
Efêmeras, ocorrem as coisas sem nome
ocupando cada seção dos detalhes.
O risco de perdê-los, permanente,
coexiste invisível no Mundo das Formas.
Como afrontá-lo? Eis o obstáculo da narração
de nossa vida inteira resumido: Não perder nada!
Um fio, uma agulha, um graveto, uma sombra;
sempre lembrar a palavra que se quer dizer;
achar as moedas perdidas no caminho.
E desfiando, um a um, os instantes,
chega-se ao triunfo de nossa epopéia diária.
Vencemos monstros, carros, corrupção, cadáveres;
atravessamos a rua sozinhos;
percebemos tudo em volta, sem vê-lo no centro.
A demora não sucede, mas também a conquistamos
sem feri-la, sequer tocá-la. Atrasa-nos, ó demora!
Pois aguardamos a conclusão, folhamos este livro,
mas nunca encontramos a última página.