Janela

Janela

29 de junho de 2011 2 Por CONPOEMA

Vi passar pela janela

Um tristonho trovador

Vi passar bela donzela

Em seus cabelos, uma flor


Vi passar a romaria

Acabrunhada, pé ante pé

Vi passar tia Luzia

Braço dado a tio José


Vi passar a moça feia

Vi passar o velho arcado

E quem passava não via

Eu, de lá, debruçado


Pela janela vi passar

Lampião e Maria Bonita

À Padim Ciço quis acenar

Mas ele também não me via


Vi Rapunzel jogando as tranças

E um príncipe pervertido

Vi Branca de Neve de mudança

Mais sete anões carcomidos


Vi passar pela janela

A vizinha fofoqueira

Vi passar de saia curta

Sua filha namoradeira


Vi descrentes carregando tintas

E fiéis, o “Livro Sagrado”

Vi o urubu carregando a viola

E a viola carregando o sapo


Vi passar o ginásio

O colégio e a faculdade

Folheava o Kama Sutra

Quando passou a virilidade


Vi garboso o Sol poente

Paquerando a Lua crescente

Vi vagalumes contentes

Brincando com estrelas cadentes


Vi passar pela janela

De vagar, quatro estações

E depois que passaram

Murcharam-se as emoções


Vi passar a Verdade

Se bulindo com a Mentira

Vi ansioso o Acaso

À espreita na esquina


Vi passar pela janela

A ala dos desgraçados

Senti um nó na goela

Pois passavam mutilados


Vi passar desilusões

E paixões desinibidas

Pensei que o amor fosse ficar

Mas ele estava de saída


Quando a poeira passou

Tapei zeloso o olhar

E depois que se assentou

Tinha desculpa para chorar


Vi passar a fria brisa

E a bruma a se dissolver

Abriram os guarda-chuvas

Nada mais eu pude ver…


Pela janela vi passar

Segredos

Momentos

Sentimentos

Vontades tão garridas

Daí então, compreendi

Que a janela era a vida