Parabéns pra “nóis”, Ôxe!

Parabéns pra “nóis”, Ôxe!

19 de junho de 2012 0 Por CONPOEMA

Nesta edição especial em comemoração a mais um aniversário do Informativo Ôxe! e Teatro Girandolá, você confere um balanço de como está sendo a caminhada dessas duas iniciativas culturais moratenses, além do encarte especial com a programação da nossa comemoração, o Oxandolá [In]Festa 2012. Além disso, sabia mais sobre o Núcleo de Experimentações Teatrais de Franco da Rocha e o Franco Mostra Teatro no bate-papo com seu fundador e idealizador, André Arruda; além de conferir os ótimos textos de Franklin Falcão, Danilo Góes, Marco Nogueira, Messias Silva (apresentando Tião Simpatia), a resposta da Superintendência de Esportes de Francisco Morato, a charge de Betto Souza e a belíssima e poética estreia de Remisson Aniceto. Tem também Na Faixa, Registro, trabalho infantil, pensamentos de muitos anos de vida e o povo invisível na contracapa.

Pegue o seu agora mesmo em um dos pontos de distribuição (veja onde, aqui) ou baixe a versão digital clicando neste link e não se esqueça de compartilhar, comentar e curtir (ou não)! E pra variar, o tempo passa, o tempo voa, mas certas coisas não mudam… com a palavra o mestre Affonso Romano de Sant’Anna.

A implosão da mentira*

Affonso Romano de Sant’Anna

Fragmento 1

Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.

Mentem, sobretudo, impune/mente.
Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente.

Mentem. Mentem e calam. Mas suas frases
falam. E desfilam de tal modo nuas
que mesmo um cego pode ver
a verdade em trapos pelas ruas.

Sei que a verdade é difícil
e para alguns é cara e escura.
Mas não se chega à verdade
pela mentira, nem à democracia
pela ditadura.

Fragmento 2

Evidente/mente a crer
nos que me mentem
uma flor nasceu em Hiroshima
e em Auschwitz havia um circo
permanente.

Mentem. Mentem caricatural-
mente.
Mentem como a careca
mente ao pente,
mentem como a dentadura
mente ao dente,
mentem como a carroça
à besta em frente,
mentem como a doença
ao doente,
mentem clara/mente
como o espelho transparente.

Mentem deslavadamente,
como nenhuma lavadeira mente
ao ver a nódoa sobre o linho. Mentem
com a cara limpa e nas mãos
o sangue quente. Mentem
ardente/mente como um doente
em seus instantes de febre. Mentem
fabulosa/mente como o caçador que quer passar
gato por lebre. E nessa trilha de mentiras
a caça é que caça o caçador
com a armadilha.

E assim cada qual
mente industrial?mente,
mente partidária?mente,
mente incivil?mente,
mente tropical?mente,
mente incontinente?mente,
mente hereditária?mente,
mente, mente, mente.

E de tanto mentir tão brava/mente
constroem um país
de mentira
             -diária/mente.

Fragmento 3

Mentem no passado. E no presente
passam a mentira a limpo. E no futuro
mentem novamente.

Mentem fazendo o sol girar
em torno à terra medieval/mente.

Por isto, desta vez, não é Galileu
quem mente,
mas o tribunal que o julga
herege/mente.

Mentem como se Colombo partindo
do Ocidente para o Oriente
pudesse descobrir de mentira
um continente.

Mentem desde Cabral, em calmaria,
viajando pelo avesso, iludindo a corrente
em curso, transformando a história do país
num acidente de percurso.

Fragmento 4

Tanta mentira assim industriada
me faz partir para o deserto
penitente/mente, ou me exilar
com Mozart musical/mente em harpas
e oboés, como um solista vegetal
que absorve a vida indiferente.

Penso nos animais que nunca mentem.
mesmo se têm um caçador à sua frente.
Penso nos pássaros
cuja verdade do canto nos toca
matinalmente.

Penso nas flores
cuja verdade das cores escorre no mel
silvestremente.

Penso no sol que morre diariamente
jorrando luz, embora
tenha a noite pela frente.

Fragmento 5

Página branca onde escrevo. Único espaço
de verdade que me resta. Onde transcrevo
o arroubo, a esperança, e onde tarde
ou cedo deposito meu espanto e medo.

Para tanta mentira só mesmo um poema
explosivo-conotativo
onde o advérbio e o adjetivo não mentem
ao substantivo
e a rima rebenta a frase
numa explosão da verdade.

E a mentira repulsiva
se não explode pra fora
pra dentro explode
          implosiva.

* – fonte: www.releituras.com

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