Depoimento Juquery

compoema_depoimentos_juquery

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[tab title=”André Arruda”][accordions]
[accordion title=”André Arruda – Depoimento 1″ load=”hide”]compoema_depoimento_andre

Psiu. Oi. Ei. Você pode falar mais baixo?

Shiiiu, ei, ei, fala mais baixo por favor. Vocês estão me atrapalhando. Vocês ficam falando alto e estão me atrapalhando.

Ei. Shiiiiiu. Chuuuuu. Chulé. Chuá. Chuva.

Água descendo do morro, porque depois desceu da chuva, porque depois desceu da cachoeira, porque depois evaporou.

Chu… chu…

Laranjeira que dá laranja que tem caroço. Caroço tem na manda, tem no abacate. Abacate. Aba… aba tem no chapéu. Chapéu tá na cabeça. Cabeça.

Água.

Chaleira.

Porcaria. Gordo. Que come porcaria. Porco. Um bando de porco. Torcida do palmeiras. Palmeiras do futebol. Futebol da copa do mundo. Copa do mundo não pe pra ter. Brasil ganhou 5 copas do mundo. Não é pra ter copa do mundo. Copa do mundo na rede globo. Globo não presta.

Oi. Ei. Você tá contando uma história? Conta uma história pra mim. Fala mais alto. Oi, ei, eu não tô entendo sua história.

Jesus Cristo, lembrei dele. Porque o mundo, as pessoas, tem pecado. Sexo, sexo dos anjos.

A e i o u, são vogais. E tem as consoantes. B c d f g h j k l m n p q r s t v w x z. Zzzzzzz. Z de zorro. O zorro tinha uma espada e fazia assim (faz no ar). Ele fazia assim (repete o movimento) e tinha uma capa. A capa do super homem, que tem visão de raio x. Olho de águia. O melhor olho do mundo. Que nem super homem que tem visão de raio x e vê tudo por dentro, pulmão, coração, osso, cérebro, tudo, tudo. Raio x é perigoso. Tem no hospital, pra ver tudo por dentro. No hospital você faz raio x, você toma remédio e fica doente, fica louco e toma choque ou então, você põe o dedo na tomada e toma choque.[/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Fabia Pierangeli”][accordions]
[accordion title=”Fabia Pierangeli – Depoimento 1: O que vale mais – 28/11/2014″ load=”hide”]compoema_depoimento_fabia
O que vale mais?
Um ser humano ou umas notas de reais?
Ela ali, perdida, sozinha, a perambular…
O olhar em volta,
procura lago em que se apegar.
Gente passando, pra lá e pra cá…
E ela ali, perdida, sozinha, a perambular…
Gente que vai, gente que vem
E ela ali, agarrada aos seus vinténs
1, 2 , 10, 100, 200 reais
Ela conta e reconta
E só assim, sem se dar conta, se torna visível
O que vale mais?
Um ser humano ou umas notas de reais?
Realmente, os reais aparecem mais
E ela continua ali, perdida, sozinha, a perambular…
mas agora com olhos a cuidar dos seus visíveis reais
Vai que alguém toma, né?!
Como ela fica?
Ela fica ali, perdida, sozinha, a perambular…
Sem os seus reais, ela realmente teria um grande problema…
Passaria, mais uma vez, despercebida
Ali, perdida, sozinha, a perambular…[/accordion]
[accordion title=”Fabia Pierangeli – Depoimento 2: Reflexões – 21/02/2014″ load=”hide”]Um universo que me intriga, me inquieta, me fascina. Racionalmente, entendo bem pouco, mas emocionalmente, tudo o que diz respeito a vida humana me envolve demais. Toda vez que entrei ou entro no Juquery, não sei explicar muito bem o que acontece, mas parece que meus poros se abrem, é como se eu pudesse, de alguma forma, sentir o quanto de histórias existem ali, impregnadas naquelas paredes, naqueles móveis, naquelas pessoas… Histórias interrompidas… quantas histórias poderiam ter sido diferentes? Quando meus olhos encontram os olhos dos pacientes, tento imaginar tudo o que ele deixou pra fora dos muros do Juquery… sonhos, amores, amigos, família.
Eu não consigo fazer ideia do que significa passar 30, 40 anos, dentro de uma instituição. Eu não consigo imaginar o que se passa dentro de cada uma daquelas pessoas. Será que existe saudade? Será que existe esperança?
Eu olho nos olhos deles e parece que há, lá dentro, um poço sem fundo, um abismo, um espaço infinito, um ser perdido em dores e poesia, um ser perdido em paixão e poesia.[/accordion]
[accordion title=”Fabia Pierangeli – Depoimento 3″ load=”hide”]Um dia eu acordei alada… ganhei asas… asas enormes e minha vida mudou. Não havia mais limites e eu podia quase tudo. Um dia eu ganhei asas enormes e aprendi a voar… Eu aprendi voar tão alto, mas tão alto, que lá de cima eu conseguia ver o mundo inteiro, lá de cima eu podia sentir o mundo inteiro.
E eu voei muito, muito, muito… Até que um dia eu fui pega em uma armadilha e me vi dentro de uma gaiola. Gaiola não é lugar de bicho que voa![/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Mariana Moura”][accordions]
[accordion title=”Mariana Moura – Depoimento 1: Sem saber…” load=”hide”]compoema_depoimento_mariana_moura
Sem saber porque dançava, mas dançava…
A passos descompassados
Ao som da melodia do passado
Passado que o tempo leva…
Futuro que o tempo apaga…
Presente que o tempo abafa…[/accordion]
[accordion title=”Mariana Moura – Depoimento 2″ load=”hide”]Parede pintada…
É espaçoso, mas tem linha, a linha limita.
Vai, sai do útero. Liberta. Sai de baixo. Sai por onde der.
Corta o corpo. Corta o sonho. Corta a vida. Me cortem!
Aquela parte imaginária que fica dentro. Sangue sujo, que sai toda vez. Eu preciso daquele bigode. Eu preciso daqueles olhos que me olham, julgando a vida inteira.
Diferente, igual. Ser igual não é diferente. Ser diferente não é igual.
Mas puxa com força, vai com força, mais a linha. Igual quando você é pequena, vai, não tem giz, não tem papel, não tem nada. Engatinha igual antes, ainda fica bamba. Pra onde você quer ir? Escolhe o leste, o oeste, escolhe. Vai e segue. Ele vai em frente, você também. Não arrasta, desliza, foi lá e fez pirueta, não faz gracinha, carinho, vida, vida, vida, música, dança e vai, é só dançar. Você pode ser preso.[/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Meire Ramos”][accordions]
[accordion title=”Meire Ramos – Depoimento 1: História de um médico que criou uma cidade” load=”hide”]compoema_depoimento_meire_ramos
Há muito tempo, havia um homem muito inteligente, que de tão inteligente que era, passou a estudar e cuidar da cabeça humana, transformando-se em um cientista.
Por falar muitas línguas, ele se comunicava com todos os gênios do mundo, e rapidamente ganhou prestígio e fama, todos estavam interessados em suas pesquisas e conclusões sobre a raça humana. Ele se dedicava a curar os males da humanidade que levavam a dor, à tristeza e ao sofrimento.
Mas para que a sociedade fosse beneficiada, e ele pudesse avançar ainda mais, ele precisaria de um lugar amplo para que suas cobaias ficassem, um lugar que ele pudesse trabalhar diariamente sem ser incomodado.
Assim, o governo de seu país lhe concedeu uma enorme terra, para que ele construísse o lugar que achasse ideal para seu respeitoso trabalho, onde pudesse acomodar quantas cobaias achasse necessário, e também pudesse construir sua nobre casa.
Felicíssimo, o cientista logo tratou de construir toda uma vila, mas onde morariam apenas, aqueles, os quais ele abria suas cabeças. Estes, eram homens, mulheres e crianças que haviam nascido diferentes dos demais homens, mulheres e crianças de seu país, e que colocavam em risco o futuro de seu local. Eram eles, tímidos demais, ou extrovertidos demais, pervertidos demais, comunistas demais, bêbados demais , pobres demais e até negros demais.
Para compreender o que se passava com estas pessoas, o cientista criou métodos incríveis, e até conseguiu amenizar muitos problemas em suas vidas, apenas com banhos na temperatura e tempo que ele descobriu ideal, ou por meio de algumas doses de insulina em seus corpos e até retirando partes inadequadas de seus cérebros. Seus remédios os acalmavam, e podiam ter uma vida bem parecida com a das pessoas normais: acordavam, comiam, trabalhavam – dentro da vila eles podiam fazer muitos trabalhos, como plantar e colher- e dormiam; já não se revoltavam mais com a vida.
As famílias estavam contentes com os resultados e cada vez mais, eram enviadas outras pessoas desajustadas para tentarem ser curadas, e ninguém era rejeitado ali.

A vila também trouxe para sua redondeza um avanço positivo, com a chegada de parentes e trabalhadores, os arredores foram se desenvolvendo, com casa, igrejas e comércio. E tudo era muito promissor. Toda uma cidade cresceu em volta da vila, e até uma estação ferroviária foi construída para melhor deslocar os viajantes até lá.
Dizem que no auge da sua história, a vila possuía 17 mil cobaias, que puderam ser modificadas pelas mãos da ciência.
E em homenagem ao importante trabalho realizado por ele, a cidade que se construiu, recebeu seu honrado nome: Franco da Rocha.[/accordion]
[accordion title=”Meire Ramos – Depoimento 2: A Genitora” load=”hide”]Eu tive um filho prematuro
Mas esse filho que gerei
Me deu netos também
Essa cidade inteira nasceu de mim
Eu tive um parto fórceps
Eu fiz um filho com a ciência
A tua rua
Esse trem
Essa gente
A tua rua esburacada
Esse trem abarrotado
Essa gente condenada
São meus descendentes
Se eu não soube cuidar
Se eu não soube criar
Foi por que a mim
Só ensinaram prender
E eu sou filha só de pai
Eu tive um filho com a ciência
E naquela noite ela se esqueceu
Da ternura[/accordion]
[accordion title=”Meire Ramos – Depoimento 3″ load=”hide”]Um tilintar que era vidro
E se quebrou
E o amor que amor que tu me tinhas?
Um tilintar
Eu era vidro
Que te cortou[/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Shirla Pereira”][accordions]
[accordion title=”Shirla Pereira – Depoimento 1″ load=”hide”]compoema_depoimento_shirla_pereira
Grande como aprisionamento.
Distante como a brisa de um vento.
Esse era o lugar obscuro, criado como um depósito para aqueles que não conseguiram se integrar .Também Juca! Já não sabiam falar, dançar.
Só descia o suor e aquele olhar distante, pra quem estavam gritando? O grito foi só para o subconsciente, ouviram vozes , sussurros , foi indiferente.
Então, ficaram ali Juca! Jogados como uma bolinha: Para direita, para esquerda, nuca para frente, pois não sabiam. Era uma jaula abandonada, com incapacitados, alienados.
Juca, sinto que estão cansados, com sede, fome instalada! Mas, não sabe qual é a fome. Quando não tinham suporte, deixavam á beira mar, os de fora tinham medo. Medo do que? Se não são eles que estão presos![/accordion]
[accordion title=”Shirla Pereira – Depoimento 2″ load=”hide”]comporma_depoimento_silvia_sapucaia
Sábio: Círculo que cresce, você entra, tem uma caixinha de felicidade, sobe a escada, cresce na sua vontade, dorme e se constrói, pensa, sorri, chora, caminha na sua vontade.
Acompanhante: O círculo está fechando, segue estreito, felicidade, está limitando, fome, fome, quero comida saborosa.
Sábio: A sociedade cresce.
Acompanhante: E você tá diminuindo.
Sábio: Pois não pensa, não busca.
Acompanhante: Essa vontade, que agonia…
Sábio: Tudo é sua vontade, você pensa, canta, sorri e sai desse ciclo vicioso.
Acompanhante: Essa dor, você pode…
Sábio: Você não pode? Você decide.
Acompanhante: Meu corpo tá cansado, minha mente tá cansada.
Sábio: Segue, segue, ali tem entrada, vai, pensa, cria estratégias, caminha, não é isso, você faz errado.
Acompanhante: Está doendo, ai que dor.
Sábio: Mas pensa… É a sua vontade, samba, samba, esse medo!
Acompanhante: Esse cansaço, esse lado do círculo, vai pra direita, vai pra esquerda, pro estreito.
Sábio: Essa escada que te cansa, esse círculo que te cansa.
Acompanhante: Esse barulho me cansa. Estou sentindo fome, me dê um prato, uma felicidade com muitas felicidades.
Sábio: Me dê uma bebida, estou com sede, quero felicidade, não tristeza.
Acompanhante: Quero escada, mas esse barulho… Ai, ai, ai, essa dor, esse movimento, tudo está latejando. Cansei dessa caixa, cansei de mim, de você, quero vida, quero sonhos, quero dormir.
Sábio: Vai, vai, vai, o relógio está tocando, vai, olha essa hora, esse tempo.
Acompanhante: Tempo, tempo… não tenho tempo, não penso, não sonho, não canto, não danço.
Sábio: Estou crescendo, aumentando, estou fortalecendo, aumentando.
Acompanhante: Fazendo parte desse ciclo vicioso, crescendo, mexendo, não, não, diminuindo, diminuindo, estou doendo, esse labirinto está me deixando com medo, medo.
Sábio: Descansa, respira, movimenta, labirinto diferente, círculo igual, escada diferente e igual ao mesmo tempo.
Acompanhante: Tudo isso é meu, essa mente, essa sociedade é minha.
Sábio: Esse corpo, essa alma, esse descanso.
Acompanhante: Tudo é meu, tudo é meu.
Os dois cantam: Lá, lá, lá.
Acompanhante: Esses passos são meus, minha vontade, essa cabeça caída é minha porque é minha vontade, meus dedos é minha vontade, meu sorriso.
Sábio: Tudo, tudo.
Acompanhante: Maria está sorrindo porque está com vontade.
Sábio: Estou seguindo e parada porque é minha vontade.[/accordion]
[accordion title=”Shirla Pereira – Depoimento 3″ load=”hide”]Frases de pacientes que permanecem em minha memória…
Esses remédios deixam a gente tudo esquecido.
Meu pai tem uma floricultura, eu gosto de flores.
Aqui criaram uma construção grande com muito café.
Você não sabe ontem eu vi um ET, eles passaram por aqui.
Guarda meu desenho para eu terminar, obrigada pela atenção.
Eu gosto do tempo que eu era moço.[/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Silvia Sapucaia”][accordions]
[accordion title=”Silvia Sapucaia – Depoimento 1″ load=”hide”]comporma_depoimento_silvia_sapucaia
Tudo que acumulei durante a vida inteira enchi um compartimento que só eu conhecia ,até
chegar ao ponto que não deu mais. Perdi parte da memória ,tive transtorno de perseguição, fui diagnosticada depressiva e afastada do trabalho.
Hoje eu tenho algumas manias que eu chamo de sequelas. Tenho fobia de espaços fechados. Não fico bem onde tem muita gente. Barulho me irrita a ponto de me deixar agressiva. Gritos me perturbam. E eu ainda tenho medo do escuro …[/accordion]
[/accordions][/tab]
[tab title=”Roseli Garcia”][accordions]
[accordion title=”Roseli Garcia – Depoimento 1″ load=”hide”]compoema_depoimento_roseli_garcia
Um vento forte que sopra – shuuuuuuuuu
Vem ver, tá enxergando?
Bem forte – aaaaaaah
Doí dentro do ouvido
Dói muito
Não, deixa! Vai passar!
Shhhh! Tá passando. Lá longe…
Um carro – tum, tum, tum…
Tá amarrado dentro do carro
Bem preso pra não fugir
Falei, não falei?
Tem que ficar quieto, sem falar, no lugar.
Ion, ion, ion
Tá pegando fogo
Um palitinho só, foi queimando
Vai subindo, queimando tudo
Bem bonito, vermelho
Até queimar o sol
Quando você vê, tá tudo vermelho
O corpo
Belisca
Não belisca, dói muito
Aqui
Depois aqui
Dentro da cabeça
Martelando- tum, tum, tum
vai virando música
Tum, tum, tum
Tum, tum, tum
“Sapo cururu, na beira do rio, quando o sapo canta, ô maninha, é porque tem frio”
Tum, tum, tum
Canta, pra mim
Canta pra eu dormir, canta
Não, não, canta mais.
Canta
Não vai embora
Volta aqui dentro
Vai tomar no cú, então
Canta um pouquinho
Vai se foder, eu não quero
Vai cantar lá fora
Eu não vou ouvir
Lá, lá, lá
Aquiiiii, dentro não
No nariz tem caca
Caca de nariz
Vou passar caca de nariz em você
Tem uma formiga no meu nariz
Vai comer meu cérebro
Vai andando
Tim, tim, tim
A formiguinha passa até chegar no olho
Olha no meu olho
E vê que eu sou grande
Como um gigante
Pisando e estremecendo
Eu sou um gigante forte
Olha o tamanho do meu braço que alcança o céu
Tá vendo? Esse espaço é todo meu!
Cresce, bem grande e bem forte.
Tudo é meu. Esse ar que vai entrando
Minha barriga está cheia de ar.
Bem cheia e é tudo meu,
Meu dedo tá mexendo
Não mexe, é meu
Só eu mexo.
O dedo que mexe é meu.
Se eu quero. Tudo é se eu quero. Só eu.
Eu que vou, eu que volto
E outro vem atrás
Na frente, só eu
Bem na mente: eu!
Eu na minha mente
Bem na frente
Um dente grande
Que nem dói
Meu, meu espaço
Cuidado! Tira a mão!
Vem, mas vem atrás
Eu que vou passando
Pra lá, pra cá
Até pra cima eu vou
Vem pra baixo
Deita. Fica deitadinho. Isso.[/accordion]
[accordion title=”Roseli Garcia – Depoimento 2 : Ensaio – 5 de março de 2014″ load=”hide”]Existe o que a sociedade chama de “padrão”, padrão para tudo quanto é coisa, isto desde que o ser humano se organiza em conjunto formando a tal “sociedade”.
São tantos os padrões ditados por ela que existe até o padrão de comportamento, este, talvez seja um dos que mais tenhamos que estar atentos, pois estar fora dele é ser considerado anormal.
Antigamente isto não era tão ruim assim, os tais “anormais” existentes na sociedade eram até cuidados e protegidos pelos ditos “normais”. Mas acontece que a população foi aumentando, e com ela os “anormais”, a correria do dia a dia, a expansão demográfica, e o crescimento desvairado e impensado das cidades, e acima de tudo, o ego e o interesse político de nossos governantes. E aí, de uma hora para outra, estes tais anormais passam a não mais serem vistos com bons olhos e sim como um estorvo social, um lixo, um incômodo.
Claro que muitos deles reagem a isto com violência, e são assim, também considerados um risco para a sociedade, desta forma, nossos governantes, pensando no bem comum da sociedade normal e produtiva, resolvem fazer o que eles chamam de higienização, tirando assim, do convívio social todos aqueles que, segundo um julgamento infundado, era considerado anormal.
Bom, aí começa um outro capítulo de nossa história.
Tirá-los da rua e colocá-los onde? Por quê? Para quê?
É neste momento então, que entra na história de nossa região uma figura de extrema importância para o desenrolar da mesma.
Para alguns ele foi um deus, já para outros é o próprio diabo. Fato é que se somos o que somos como cidade, muito vem de suas atitudes, até porque, nesta época, vale lembrar, ainda não existíamos como tal.
Veio então o Doutor, Franco da Rocha era seu nome.
Trazia novas ideias, métodos e informações. Homem estudado, já tinha tudo planejado, um pacote completo com ideias, e ideias que em tudo daria certo.
Ganhou a confiança dos governantes, o reconhecimento dos comandantes e o dinheiro para levar tudo adiante.
No entanto, uma ressalva, um pedido especial: que o lugar fique bem longe. Foi o que pediu o povo dito “normal”. Aceito o pedido e no resto foi tudo atendido. Lindos campos foram escolhidos, terras produtivas, era o que lhe daria guarida.
Para cá foram trazido, aos poucos iam chegando, gente daqui, dali e de acolá. Quer dizer, muito mais de acolá, de bem longe, pois aqui ainda não havia ninguém.
Veio gente de todo tipo, homem, mulher, branco, preto, estrangeiro, rico, pobre, e muito mais do que se possa imaginar. Uns vieram para trabalho, outros tantos para morar. Fato é que foram ficando e em pouco tempo uma cidade foram formando.
Assim nasceu o Juquery. Com objetivos claros: para uns, dar trabalho, para outros, acalento, e para muitos, experimentos.
Vieram então, as lobotomias, a laborterapia, os eletrochoques, a malarioterapia, o banho de imersão e muito mais que no intuito de curar, a muitos só fez traumatizar.
Houve a segregação, o racismo, a diferença entre as classes sociais, houve até aquele que ganhou um lar.
Chegavam de carro,de ônibus, de trem, de avião, de terras distantes de montão. Amontoando-se pelo espaço, onde já não mais se conseguia mudar os passos de tanta gente fora do compasso.
O que fazer então?
É tanta gente saindo pelo ladrão que já não há mais controle da razão.
Eis novamente a solução: Padronizar o comportamento, então!
E foi assim, como um livro que li quando criança, seu nome era “ A droga da obediência”.
Os “pacientes”, pois eram assim que ficavam, eram dopados e muitos dos 17 mil foram abandonados e por não mais se fazerem notar, foram de fato calados!
Há quem diga que o trabalho enobrece o homem, no entanto ali dentro produzir seu alimento já não era mais o negócio do momento. O capitalismo selvagem aliado aos interesses escrotos de muitos políticos, ditavam novas regras e, a terceirização tornou-se a solução, acabando com o pouco que restava de humanização.
Pronto! Estava lá, declarado para quem quisesse enxergar, Juquery, um deposito humano! Foi assim que este começou a chamar a atenção dando início a um novo processo, o da luta anti-manicomial.
Vamos então as devoluções!
Mas devolver o quê? Para quem?
Recebeu-se uma criança cheia de vida, sonhos, amor, esperança das mãos de seus pais, e hoje, 50, 60, 70 anos depois, ou mais, o que temos? Nem mesmo os pais mais conhecemos.
O jeito agora é guardar, e esperar que o tempo venha levar, assim aos poucos tudo vai se esvaziando e o Juquery, como um mito vai ficando.[/accordion]
[/accordions][/tab]
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